Vozes indígenas não são ouvidas em primeira audiência de conciliação sobre marco temporal

Vozes indígenas não são ouvidas em primeira audiência de conciliação sobre marco temporal

Organizações Indígenas ameaçam sair da corte caso a conciliação não ouça representantes indígenas

Aconteceu no dia 5 de agosto 2024, na sede do Supremo Tribunal Federal (STF) em Brasília, a primeira audiência de conciliação que pauta a Lei 14.701/2023, que diz respeito ao Marco Temporal. Representantes da bancada ruralista e lideranças indígenas estiveram presentes e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) foi representada pela assessoria jurídica, Kari Guajajara e o representante da Coiab na Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Kleber Karipuna. A conciliação é levantada pelo Ministro Gilmar Mendes, visa manter a validade do projeto de lei que reconheceu o marco e de processos nos quais entidades que representam os indígenas e partidos governistas contestam a constitucionalidade da tese.

O que podemos esperar de uma conciliação onde indígenas são barrados de entrar no Supremo Tribunal Federal? Logo antes de se iniciar a audiência de conciliação, representantes indígenas foram impedidos de entrar no STF. Os mesmos são porta vozes das populações indígenas em um diálogo iniciado nessa segunda-feira, mesmo o Ministro Barroso pedindo desculpa e justificando falha na segurança, podemos afirmar que ser barrado na porta seria uma das primeiras violências do dia contra nós, povos indígenas.

Já na leitura inicial, Gilmar Mendes faz conotação desenvolvimentista a favor do marco temporal, o mesmo não se deu ao trabalho de ficar até o final em uma conciliação que o mesmo levantou, deixando Diego Viegas Veras, representando seu gabinete, que fez falas colocando como ponto positivo ouvir os ruralistas, os principais responsáveis no ataque de tiros a um grupo indígenas no estado do Mato Grosso do Sul.

O Juiz Diego Viegas, fala ainda que a conciliação é uma ótima oportunidade, “… ela pode ser positiva para todos e quem sabe sair de lá com a meta de demarcar todas as terras indígenas em 5 anos.” E continua “… os povos indígenas são privilegiados, pois pode ser senhores do próprio destino”, enfatizando que os povos indígenas são atores representantes de seus próprios interesses. Porém, ao ser questionado se a conciliação continuaria sem a presença dos indígenas, o juiz diz que sim, continuaria. Fala essa que nos leva a pensar que a representação indígena ali não é levada em consideração. Essa citação foi levantada por Eloy Terena, representante do Ministério dos Povos Indígenas, “Quando vocês saírem a gente prossegue sem vocês”, esse discurso é violento e não podemos deixar que ele persista, ainda mais em uma audiência onde o intuito é conciliar e não atacar, visto que desde a colonização nossos corpos já são violentados dia-pós-dia. Eloy lembra ainda que “… compete a União valorizar os povos indígenas, e garantir que os direitos indígenas sejam respeitados”.

Kleber Karipuna, coordenador executivo da Apib lembra que o movimento indígena não concorda com a conciliação, “os direitos indígenas são inegociáveis”. E também fala que não são os povos indígenas que não entenderam a decisão do STF, na verdade, foi o congresso que não entendeu na votação para a lei 14.701.

Na vez da fala de Kari Guajajara, assessora jurídica da Coiab, faz menções aos povos indígenas e a importância da representação e escuta dessas vozes, que pode ser visto pelo vídeo abaixo:

Kari fala ainda “… não somos nós povos indígenas que criamos conflitos, já estávamos aqui desde sempre. A ganância não os faz enxergar que vocês não pensam no planeta e nas futuras gerações”.

Em coletiva de imprensa da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, os representantes indígenas lamentam os posicionamentos equivocados do Juiz Diego, e dos representantes ruralistas. E ressalta que mesmo o posicionamento for se retirar do processo de conciliação enquanto Apib, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), está apta a atender e ouvir as vozes das populações indígenas, e não esperam menos do Ministério dos Povos Indígenas.

A coletiva pode ser assistida na íntegra pelo link: https://bit.ly/3Ah9bak

A coiab e Apib convocaram suas bases para mobilizações contra negociação dos direitos indígenas durante todo o dia, e também chamam para uma próxima mobilização no dia 30 de outubro.

Texto: Robson Delgado Baré

Imagem: Vicente Taveira

https://bit.ly/3Ah9bak 

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